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Lei Penal do Tempo

Olá!


Hoje, vou abordar um assunto muito cobrado nas provas da OAB: a Lei penal no tempo. Esse tema está fundamentado na teoria da norma pelos doutrinadores e na Constituição Federal em seu Art. 5º, inciso XL que diz:


Art. 5º, XL - a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu

De acordo com a primeira parte do artigo 5º, a regra é a proibição da retroatividade da lei penal que a doutrina classifica como princípio da irretroatividade da lei penal. Essa regra tem seu alicerce no princípio da legalidade determinado, tanto no artigo primeiro do código penal, como na Constituição Federal em seu Art. 5º, inciso XXXIX:


não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal.

Todavia, na segunda parte do inciso XL do Art. 5º há uma exceção, quando a nova lei posterior entra em vigência e esta beneficia o réu, ela poderá ser aplicada a fatos anteriores, por isso é imprescindível estabelecer qual lei penal deverá reger o caso concreto e para isso precisamos observar se esta nova lei é mais gravosa ou se é mais benéfica ao réu, ou seja, deve ser observada a natureza dessa lei.


Segundo a doutrina, a aplicação da lei que está em vigência a fatos ocorridos é chamada de atividade da lei (tempus regit actum), contudo quando uma lei for aplicada a fatos fora do seu período de vigência, ocorre o que os doutrinadores chamam de extra atividade da norma. Faz necessário salientar que a extra atividade da lei penal é dividida em retroatividade e em ultratividade A retroatividade da lei penal é a aplicação da lei nova que retroage para alcançar fatos que ocorreram no passado, já ultratividade da lei penal é a aplicação de uma lei revogada a fatos ocorridos depois dessa revogação.


É necessário destacar que existem dois tipos de leis penais benéficas para o réu que são a novatio legis in mellius e a abolitio criminis estabelecidos no Artigo 2º e no seu parágrafo único do Código Penal:


Art. 2º - Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória. 

Parágrafo único - A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado.

A novatio legis in mellius ocorre quando lei posterior torna a situação do réu mais benéfica, mas a conduta praticada por ele não deixa de ser crime, por exemplo, o réu está sendo processado pelo crime de furto e no decorrer do processo surge uma pena mais branda para esse crime, logo essa lei que modificou a pena e que torna a situação do réu mais benéfica será aplicada.


Já a abolitio criminis deixa de considerar determinada conduta tipificada como crime, causando assim a extinção da punibilidade do agente, como exemplo a Lei n. 1.106/2005 que deixou de considerar condutas criminosas, como o adultério, a sedução e o rapto consensual. Essas leis devem ser aplicadas aos casos concretos independentemente se o réu encontra-se na fase de processo ou se já está na fase de execução da pena, contudo nesse último caso há uma alteração de competência na aplicação da lei mais benéfica e o juízo da execução é aquele que ficará responsável por sua aplicação de acordo com a súmula 611 do STF:


Transitada em julgado a sentença condenatória, compete ao juízo das execuções a aplicação de lei mais benigna.

Já as leis penais, que são mais prejudiciais e que tem seu alicerce no princípio da irretroatividade da norma, se dividem em novatio legis in pejus e novatio legis incriminadora. A novatio legis in pejus é uma nova lei que mantém a conduta como crime, porém agrava ainda mais a situação do réu. Essa lei mais gravosa não será aplicada caso o réu esteja sendo processado por exemplo, pois a lei que será aplicada é aquela que estava vigente no momento do crime, visto que aquela lei era mais benéfica, logo para essa situação é adotada a teoria da atividade.


No tocante, a novatio legis incriminadora, ela define um fato, que não era uma conduta ilícita como crime, logo essa lei não irá retroagir para punir aqueles que praticaram a conduta no passado, somente serão processados e julgados os que cometeram a conduta após a vigência dessa lei incriminadora.


Contudo, há algumas exceções que são necessárias serem escurecidas nos crimes classificados pela doutrina como permanentes, que são aqueles que se prolongam no tempo como sequestro e os crimes continuados que são várias práticas criminosas continuadas. Logo, caso surja uma lei penal nova que trate dessas condutas enquanto esses crimes estão sendo praticados essa lei será aplicada independentemente se é mais gravosa ou mais benéfica para o réu. Como exemplo, no caso do crime de sequestro do irmão de Zezé de Camargo, Wellington Camargo, que o Brasil acompanhou, se sai uma lei ainda antes de entregar o irmão, a lei a ser aplicada será a que entrou em vigor no ordenamento jurídico antes do término da conduta praticada como crime, nesse caso o sequestro, é o que diz a súmula 711 do STF:


A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência.

Quanto as leis temporárias que surgem para regular algum fato em um certo período de tempo e as lei excepcionais que surgem para regular situações como crises e calamidades do país, são ultra ativas, ou seja, elas são aplicadas mesmo após a sua revogação, pois elas não perdem a sua eficácia apesar da sua vigência, logo o réu pode ser condenado por essas leis ainda que elas tenha perdido a vigência. A título de exemplo, foi decretado durante o ano de 2019 a Lei nº 5.321 que proibiu a pesca do peixe dourado por cinco anos nos rios de Mato Grosso do Sul. Entre as sanções definidas por essa lei temporária foi prevista uma multa mínima no valor de R$ 2,7 mil, bem como 1 a 3 anos de detenção.


Portanto, se no ano de 2024 ficou comprovado que João pescou no rio em setembro de 2020, ele responde pelo crime previsto na Lei nº 5.321, por quê? Porque mesmo já tendo cessado a vigência da lei, os efeitos, tanto das leis temporárias, como das leis excepcionais, se prolongam no tempo.


Bem, por hoje é só. Espero que vocês tenham gostado desse artigo e até a próxima.



Sabrina Santos

Advogada



*Este artigo é produzido com o apoio do Fundo Baobá, por meio do Programa de Aceleração do Desenvolvimento de Lideranças Femininas Negras: Marielle Franco.

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