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Dano moral como forma de combate às práticas de racismo


O racismo se caracteriza por meio do sistema que afirma a superioridade de um grupo racial sobre outros. Essa convicção foi utilizada no passado para justificar a escravidão e outros sistemas totalitários. Mas, mesmo em pleno século XXI, com tantas leis criminalizando condutas racistas, ainda é constante os atos discriminatórios, principalmente, em desvalia à raça negra.


Sabemos também que o racismo é institucional, sendo assim, no judiciário, em âmbito da esfera criminal, a Lei n.º 7.716/89 determina que apenas é racismo quando as ofensas praticadas pelo autor atingem toda uma coletividade. E logo, tal denúncia é reduzida para injúria racial que, por sua vez, ocorre quando o autor ofende a dignidade ou o decoro de outrem, utilizando elementos de ‘raça’, cor, etnia, religião, onde a pena prevista é detenção de um a seis meses ou multa e é possível o pagamento de fiança.


O que observamos no Brasil é que, mesmo após 31 anos da Lei n.º 7.716/89, sua efetividade ainda é questionada, como exemplo utilizo o estado do Rio Grande do Sul que é considerado o estado com maior incidência de racismo no Brasil. Nos casos levado a esfera criminal, apenas 6,8% das causas geram condenações, 70% dos processos dão vitória ao réu(racista). Esses dados cumulado com o fato da progressão da pena não submeter a prisão faz com que o sentimento de impunidade prevaleça e fomente a prática deste crime. Porém, há outra forma de combate ao racismo que pouco ouvimos falar, a indenizatória.


O dano moral ocorrido por ataques racista já vem sendo objetos de ações na esfera civil e trabalhistas. Como podemos ver no julgado:


AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014 . ASSÉDIO MORAL. TRATAMENTO DISCRIMINATÓRIO. RACISMO. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. VALOR ARBITRADO. A reclamante não apresenta argumentos capazes de desconstituir a juridicidade da decisão que denegou seguimento ao recurso de revista, à míngua de comprovação de pressuposto intrínseco previsto no art. 896 da CLT. Na hipótese, a Corte Regional firmou convencimento de que restou configurado o assédio moral e o tratamento discriminatório, de cunho racial, no âmbito da reclamada, e que o valor de R$ 70.000,00 (setenta mil reais) atende o princípio da razoabilidade, bem como o critério satisfativo-punitivo da compensação por dano moral. Nesse contexto, tal como assinalado na decisão agravada, emerge como óbice ao recurso de revista o disposto na Súmula nº 126 do TST . Agravo de instrumento a que se nega provimento. (TST - AIRR: 7091320155120014, Relator: Walmir Oliveira da Costa, Data de Julgamento: 19/04/2017, 1ª Turma, Data de Publicação: DEJT 24/04/2017)

Dano moral é toda ofensa ou violação dos bens de ordem moral de uma pessoa, tais sejam o que se referem à sua liberdade, à sua honra, à sua saúde (mental ou física), à sua imagem. A Constituição federal assegura o direito a reparação do dano moral sofrido nos termos do art. 5º, incisos, III, V e X:


Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.(...)
III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante;(...)
V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;(...)
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.

Trabalhos acadêmicos e profissionais da psicologia listam consequências como depressão, estresse e baixa autoestima entre os problemas sofridos por quem é vítima constante não só da agressão racista aberta, mas de uma estrutura social e cultural em que o negro frequentemente aparece inferiorizado e humilhado.


Em 2002, o Conselho Federal de Psicologia admitiu que existe o racismo e que ele é um vetor de sofrimento psíquico. Dado consolidado entre 2012 e 2016, onde a taxa de pessoas brancas entre 10 e 29 anos que tirou a própria vida permaneceu a mesma, já entre jovens e adolescentes negros ela subiu, de 4,88 mortes para 5,88, a cada 100 mil pessoas.


O quatium indenizatório oscila bastante a depender do porte financeiro da parte ré, das provas levadas aos autos que demonstram os reflexos do abalo sofrido, possuindo uma média de valores de cunho indenizatório na esfera cível de R$3.000,00 (três mil reais). O valor ainda é considerado irrisório, pois estudos demonstram o quão nocivo o racismo é e os seus efeitos as vítimas sofridas.


Destacamos que este artigo não visa desencorajar ao enquadramento e denúncia dos casos de racismo, mas sim ofertar outra forma de punir aqueles que cometem este crime e que por muitas vezes infelizmente esta é a forma que leva a justiça propriamente dita, bem como  não há impedimento em ingressar em ambas as esferas.


Juliana Lima

Advogada





*Este artigo é produzido com o apoio do Fundo Baobá, por meio do Programa de Aceleração do Desenvolvimento de Lideranças Femininas Negras: Marielle Franco.

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